Todos sentiram quando a morte entrou
com um frêmito apressado de retardatária.
A que tinha de morrer, — a que a esperava, —
fechou os olhos
fatigados de assistirem ao mal-entendido da vida.
Os que a choravam sabiam-na sem pecado,
consoladora dos aflitos,
boca de perdão e de indulgência,
corpo sem desejo,
voz sem amargor.
A que tinha de morrer fechou os olhos fatigados,
mas tranqüilos...
Porque os que a choravam nunca saberiam
o rancor sem perdão de sua boca,
o desejo saciado de seu corpo,
o amargor de sua voz,
a sua angústia de arrastar até o fim a alma postiça que lhe fizeram,
o seu cansaço imenso de abafar, secretos, na carne ansiosa,
a perfeição e o orgulho de pecar.
A que tinha de morrer fechou os olhos para sempre
e os que a choravam
nunca souberam de alguém que foi de todos junto ao leito à hora do exausto coração parar
o mais distante,
o mais imóvel,
o que não soluçou
o que não pôde erguer as pálpebras pesadas,
o que sentiu clamar no sangue o desespero de sobreviver,
o que estrangulou na garganta o grito dilacerado do solitário,
o que depôs, sobre a serenidade da morte purificadora,
a redenção do silêncio,
como uma pedra votiva de sepulcro.