Como o índio a saudar o sol nascente,
Co'o sorriso nos lábios, franco e ledo
Aperto a tua mão:
Cantor das açucenas, crê-me agora,
Este canto que a lira balbucia
É pobre, mas de irmão!
Quando se sente como eu sinto e sofro,
A mente ferve e o coração palpita
De glórias e de amor:
Se ouço Arthur ao piano eu me extasio,
Mas ouvindo teus hinos me arrebato
E pasmo ante o cantor!
Na juventude, no florir dos anos,
Não sei que vozes nos entornam n'alma
Canções de querubim!
Uns perdem, como eu, cedo os verdores,
Mas outros crescem no primor das graças
E tu serás assim!
Oh! mocidade! como és bela e rica!
Hinos de amores neste sec'lo bruto!
Louvor ao menestrel!
Palmas a ti, cantor das açucenas!
Quatorze primaveras nessa fronte
Semelham-te um laurel!
Quando tão moço, no raiar da vida,
Já doce cantas como o doce aroma
Das lânguidas cecéns,
Podes, criança, erguer a fronte altiva!
Como André-Chénier, no crânio augusto
Alguma cousa tens!
Não desmintas, irmão, este profeta,
Sibarita indolente, sobre rosas
Não queiras tu dormir,
Se ao longe já te brilha amiga estrela
Aproveita o talento - estuda e pensa -
É belo o teu porvir!
Não faças como nós; na infância apenas
Solta poeta o gorjear de amores
Que é doce o teu cantar.
Seja a vida p'ra ti só riso e galas
E adormeças a cismar quimeras
Da noite no luar.
Não faças como nós; não desças louco
A buscar sensações na bruta orgia
Das longas saturnais;
Se a lama impura salpicar-te as penas,
Sacode as asas minha pomba casta
E foge dos pardais.
Não manches meu poeta as vestes brancas
No mundo infame; mirra-se a grinalda
E vão-se as ilusões!
A crença se desbota e o nauta chora
Desanimado no vaivém teimoso
Dos grossos vagalhões!
Foge do canto da gentil sereia
Que engana com sorriso de feitiços
- Tão pálida Rachel!
Não encostes na taça os lábios sôfregos...
O vaso queima e beberás nos risos
Da amargura o fel!
Conserva na tua alma a virgindade,
E tenha o coração na rica aurora
Das rosas o matiz;
Se a donzela cuspir nos teus amores
Chora perdida essa ilusão primeira...
Mas vive e sê feliz!
Se a dor for grande não te vergues fraco,
Oh! não escondas no sepulcro a fronte
Aos raios deste sol;
Não vás como Azevedo - o pobre gênio -
Embrulhar-te sem dó na flor dos anos
Da morte no lençol!
Vive e canta e ama esta natura,
A pátria, o céu azul, o mar sereno,
A veiga que seduz;
E possa meu poeta essa existência
Ser um lindo vergel todo banhado
De aromas e de luz!
Oh! canta e canta sempre! esses teus hinos
Eu sei, terão no céu ecos mais santos
Que a terra não dará;
Oh! canta! é doce ao triste que soluça
Ouvir saudoso no cair da tarde
A voz do sabiá!
Canta! e que teus hinos d'esperança
Despertem deste mundo de misérias
A estúpida mudez;
E dos prelúdios dessa lira ingênua
Em poucos anos surgirá brilhante
Millevoye - talvez!