Antonio de Castro Alves

14 March 1847 – 6 July 1871 / Curralinho

A uma atriz

Branco cisne que vagavas
Das harmonias no mar,
Pomba errante de outros climas.
Vieste aos cerros pousar.
Inda bem. Sob os palmares
Na voz do condor, dos mares,
Das serranias, dos céus...
Sente o homem — que é poeta.
Sente o vate — que é profeta
Sente o profeta — que é Deus.
Há alguma cousa de grande
Deste mundo na amplidão,
Como que a face do Eterno
Palpita na criação...
E o homem que olha o deserto,
Diz consigo: 'Deus 'stá perto
Que a grandeza é o Criador'.
E, sob as paternas vistas,
Larga rédeas às conquistas
Pede as asas ao condor.
Inda bem. A glória é isto...
É ser tudo... é ser qual Deus...
Agitar as selvas d'alma
Ao sopro dos lábios teus...
Dizer ao peito — suspira!
Dizer à mente — delira!
A glória inda é mais:
É ver Homens, que tremem — se tremes!
Homens, que gemem — se gemes!
Que morrem-se vais morrer!
A glória é ter com o tridente
Refreada a multidão,
— Oceano de pensamentos
Que tu agitas cota mão!
— Montanha feita de idéias,
Que sustenta as epopéias
Que é do gênio pedestal!— Harpa imensa feita de almas,
Que rompe em hinos e palmas,
Ao teu toque divinal.
Mas esqueceste... Não basta
'Chegar, olhar e vencer'
Do gênio a maior grandeza
O ser divino é sofrer.
Diz!... Quando ouves a torrente
Do entusiasmo na enchente
Vir espumar-te lauréis;
Nest'hora grande não sentes
Longe os silvos das serpentes,
Que tentam morder-te os pés?
Inda é a glória — rainha
Que jamais caminha só.
Aí! Quem sobe ao Capitólio
Vai precedido de pó.
Porém tu zombas da inveja...
Se à noite o raio lampeja
Tu fazes dele um clarão!
Pela tormenta embalada
Ao som da orquestra arroubada
Vais-te perder n'amplidão.
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