É uma visão medonha uma caveira?
Não tremas de pavor, ergue-a do lodo.
Foi a cabeça ardente de um poeta,
Outrora à sombra dos cabelos loiros,
Quando o reflexo do viver fogoso
Ali dentro animava o pensamento,
Esta fronte era bela. Aqui nas faces
Formosa palidez cobria o rosto...
Nessas órbitas?ocas, denegridas! ?
Como era puro seu olhar sombrio!
Agora tudo é cinza. Resta apenas
A caveira que a alma em si guardava,
Como a concha no mar encerra a pérola,
Como a caçoula a mirra incandescente.
Tu outrora talvez desses-lhe um beijo;
Por que repugnas levantá-la agora?
Olha-a comigo! Que espaçosa fronte!
Quanta vida ali dentro fermentava,
Como a seiva nos ramos do arvoredo!
E a sede em fogo das idéias vivas
Onde está? onde foi? Essa alma errante
Que um dia no viver passou cantando,
Como canta na treva um vagabundo,
Perdeu-se acaso no sombrio vento,
Como noturna lâmpada, apagou-se?
E a centelha da vida, o eletrismo
Que as fibras tremulantes agitava
Morreu para animar futuras vidas?